Por Maria Esperidião e Letícia Kleim, Abraji
No início do terceiro ano do governo Bolsonaro, o presidente fez cinco ataques à imprensa. As declarações foram dadas ao longo desta primeira semana de 2021 e se somaram a outros comentários que provocaram reações do Judiciário e do Legislativo.
Na terça-feira, 5.jan.2021, diante de apoiadores que se concentravam na área externa do Palácio da Alvorada, Bolsonaro voltou a responsabilizar jornalistas e veículos por, segundo ele, maximizar a maior crise sanitária da história recente, que já matou mais de 200 mil brasileiros.
“Chefe, o Brasil está quebrado, e eu não consigo fazer nada. Eu queria mexer na tabela do Imposto de Renda, teve esse vírus potencializado pela mídia que nós temos aí, essa mídia sem caráter. É um trabalho incessante de tentar desgastar para tirar a gente daqui e atender interesses escusos da mídia”, disse.
Na quarta-feira, dia 6.jan. 2021, em nova conversa com apoiadores, o presidente criticou a mídia pela repercussão das afirmações dele do dia anterior, que geraram críticas de economistas e políticos de diversas correntes partidárias. Para o presidente, a imprensa é o maior problema do Brasil e as empresas jornalísticas são piores do que lixo.
Na quinta-feira, 7.jan.2021, as hostilidades não cessaram. Primeiro, chamou o editor-chefe e apresentador do Jornal Nacional, William Bonner, de “sem vergonha e canalha”. Depois, estendeu as ofensas à imprensa de um modo geral. Ao comentar a invasão ao congresso americano, foi mais longe:
“Aqui no Brasil, se tivermos o voto eletrônico em 22, vai ser a mesma coisa. A fraude existe. Aí a imprensa vai falar: ‘Sem provas, diz que a fraude existe’. Eu não vou responder esses canalhas da imprensa mais, tá certo? Eu só fui eleito porque tive muito voto em 18″.
Depois de a maior autoridade do país falar sobre fraude na apuração das eleições de 2018, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luís Roberto Barroso, disse que as declarações contribuem para a “ilegítima desestabilização das instituições”. Os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia, ambos do DEM, também condenaram a frase de Bolsonaro.
Ao fim da quinta-feira, na live que transmite semanalmente em suas redes sociais, o presidente reforçou o discurso de que a imprensa seria responsável pelo pânico e perda de vidas durante a pandemia, desta vez classificando a mídia de “vergonha nacional”:
“A gente não tem escapatória, quando fala dessa imprensa aqui que não tem qualquer compromisso com a verdade e com a vida do ser humano [segurando uma folha impressa do jornal O Estado de S. Paulo]. E quando vocês pregam mentiras e desinformam, inventam, vidas morrem. Quando vocês levam o terror no tocante à covid, que leva o pânico à população, fecha o comércio, tomam as medidas de lockdown. (…) Esse trabalho porco, de grande parte da mídia, aí incluído esse jornal O Globo também. Essa imprensa que, pelo amor de Deus, é uma vergonha, uma vergonha nacional.
Monitoramento realizado pela Abraji mostra que Bolsonaro foi responsável por 123 dos 366 alertas para ataques à liberdade de expressão e de imprensa registrados ao longo do ano de 2020. O monitoramento é feito a partir dos indicadores regionais desenvolvidos pela rede Voces del Sur, em atenção ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16.01 da ONU.
Em 2020, Bolsonaro já havia dito que a mídia dissemina “histeria” e “pânico”, sendo creditada como responsável pela crise sanitária. O presidente foi o principal autor de discursos estigmatizantes que descredibilizam a imprensa e incentivam seus apoiadores no mesmo sentido. Dos 152 alertas para discursos estigmatizantes, 95 registram Bolsonaro como agressor.
Ainda segundo outro levantamento da Abraji, que acompanha o bloqueio de jornalistas no Twitter por parte de autoridades públicas, o chefe do executivo no país é o que mais barra profissionais de imprensa para acompanhar sua conta na plataforma.
(Publicado pela Abraji. Crédito da foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.)
[11/1/21]