Jornalistas sofrem censura e intimidação durante cobertura de ação policial em Carmo da Mata

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Mais um caso de cerceamento do trabalho de jornalistas por parte da Polícia Militar ocorreu em Minas Gerais, desta vez no município de Carmo da Mata, no Centro-Oeste mineiro, no dia 29 de maio passado. O jornalista Thiago Góis e a repórter Maria Tereza Oliveira, da equipe do jornal ANotícia, acusam um soldado de censura, constrangimento, intimidação e abuso de autoridade, prejudicando e interrompendo a cobertura de uma ação policial.

O Sindicato recebeu a denúncia e fez contato com a Companhia da PM em Oliveira, responsável pelo policiamento em Carmo da Mata. O cabo Paulo Vitor disse que transmitiria a informação ao capitão Campos e que este entraria em contato com o Sindicato na terça-feira 27/6.

O Sindicato repudia esse comportamento ilegal e antidemocrático e exige providências das autoridades.

A seguir o relato minucioso do episódio feito pelos jornalistas.

 

O jornalista Thiago Góis e a repórter Maria Tereza Oliveira, da equipe do jornal Anotícia, de Carmo da Mata, foram constrangidos perante vários cidadãos, intimidados e sofreram abuso de autoridade por um policial militar durante a cobertura da troca de tiros entre PM e bandidos que resultou na prisão de dois foragidos da justiça.

Os dois profissionais da imprensa sofreram violação das liberdades constitucionais e do livre exercício da profissão de jornalista ao serem coagidos e obrigados a apagar uma foto em que aparecia o soldado A Silva, na frente da viatura, sob escolta de um detido, sob a alegação de que “o policial não havia autorizado o uso de sua imagem em qualquer veiculação”.

Ora, o fato em questão era a operação exitosa da PM e a prisão dos bandidos, não o militar em questão ou a sua ação naquela tarde. Causa estranheza o fato do militar, servidor público estadual, pago em pecúnia dos nossos impostos, fardado e no exercício de sua profissão, agir desta maneira, com traços de prepotência e abuso de autoridade, conforme passaremos a narrar.

Além disso, foram intimidados quando o militar tirou um celular do bolso e passou a registrar fotos do carro de reportagem e de sua placa, com o intuito de coagir os profissionais.

É importante frisar que o ocorrido foi um fato isolado, já que os outros policiais envolvidos na operação trataram a imprensa e seus profissionais com respeito, profissionalismo e trabalharam em harmonia com os meios de comunicação social presentes.

O acontecido

Ao chegarem na entrada da Santa Casa de Carmo da Mata, onde ocorria atendimento médico a um bandido baleado e exame de corpo delito no outro cidadão preso, a equipe do jornal impresso ANotícia iniciou o trabalho de praxe registrando o local, a viatura com o preso e a movimentação.

Havia muitas pessoas no lado de fora do hospital, quando o militar soldado A Silva, da Companhia da PM de Oliveira, passou a indagar em voz alta o porquê dos registros fotográficos feitos pela repórter Maria Tereza. A profissional da imprensa respondeu que seria para divulgação e o jornalista Thiago Góis disse que era para jornal impresso. O militar novamente agiu com abuso e arrogância, sendo taxativo. “Não perguntei se é para jornal. Não dei o direito de uso de minha imagem e exijo que as fotos sejam apagadas.”

O jornalista, em diálogo com a repórter, mesmo diante daquela cena arbitrária contra a liberdade de imprensa e informação, assinalou para que a fotógrafa apagasse as fotos, mas sinalizou: “Tudo bem, Maria. Pode apagar as fotos, mas continue fazendo o trabalho, pois estamos em um espaço público”.

Novamente o soldado, para surpresa de todos que ali observaram, agiu com estupidez e falta de preparo e conhecimento da Constituição Federal. “O espaço pode ser público, mas eu não sou público”, gritou A. Silva.

Mesmo sabendo que no exercício da função pública de militar, pago com dinheiro do Estado e cumprindo função de zelar pela ordem e proteger a todo o público (população), com sabedoria o editor e jornalista do jornal ANotícia ignorou novamente a afronta e abuso, mas alertou novamente a integrante da equipe sobre as garantias constitucionais que possuem os profissionais da comunicação. “Maria, pode continuar registrando as fotos e fazendo o seu trabalho, pois a liberdade de imprensa é um dos pilares da democracia”, disse.

Neste momento, ainda sob os olhares de muitos populares que ali estavam, em relação àquela atrocidade e violação de direitos, o soldado tornou a intimidar o jornalista. “Ôh, Doutor… eu sei dos meus direitos tá bom?!”.

A equipe seguiu registrando e para surpresa de todos o PM sacou um celular do bolso e passou a registrar fotos do carro de reportagem usado pelos profissionais, com registros com flash, para destacar a ação intimidadora. Várias fotos do carro foram registradas, da placa do mesmo e da lateral.

Sem reação, a equipe não conseguiu concluir a apuração na Santa Casa e sequer conversar com os profissionais da medicina que estavam em atendimento e iriam repassar o estado clínico dos envolvidos bem como outras informações médicas.

Ao toque de recolher, a equipe sentindo que teve seu espaço invadido, sem graça com o abuso de autoridade e violento do policial e com as pessoas que ali observavam aquela situação vergonhosa, sentiu-se obrigada a sair do local. O militar, temendo ser identificado, ou temeroso do caso ser levado ao conhecimento de seus superiores, usou o braço esquerdo para esconder seu nome e graduação militar. Acontece que parte do nome Silva não foi ocultado e, mais tarde, a equipe conseguiu identificar os dados do policial.

A imprensa é uma parceira da população, que ajuda diariamente na divulgação de informações para a sociedade, sempre em sintonia com a polícia. O que não pode permanecer são militares que abusam da farda para manchar a reputação da corporação policial mineira, que tem o respeito de todos.

A direção do jornal ANotícia repudia veementemente o comportamento e o ato isolado na tarde de segunda (29) e pede uma posição do Comando da Polícia Militar, no sentido que este tipo de situação não volte a acontecer com outros profissionais ou cidadãos de bem que estão no exercício profissional de suas atuações.

Direito

Segundo parecer do setor jurídico consultado pela reportagem, é assegurado a todo cidadão o direito de registrar fotos e filmar o “que quiser em espaços públicos, em especial em momentos de interesse público de toda a sociedade, que tem direito à informação”. Essa garantia está disposta no artigo 5º da Constituição Federal, bem como na Declaração de Princípios Sobre Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

O documento explica ainda que esse tipo de imagem possui validade jurídica, uma vez que a ação para coibir profissionais da informação por parte das forças policiais configura “abuso de autoridade, o que por si só justificaria os registros e poderia vir a servir como uma eficiente prova para ajudar na averiguação e punição do envolvido”.

Os únicos casos em que os policiais podem determinar o afastamento dos jornalistas são os que envolvem risco à segurança daquele que está filmando ou registrando fotos ou se a área estiver isolada pela polícia, sob o pretexto de defesa da integridade dos cidadãos.

A legislação também deixa claro que “nenhum policial tem o poder para determinar que se desligue uma câmera”, visto que tal ação configura abuso de autoridade.

A Lei 4.898/65, que trata sobre abuso de autoridade, assegura o direito de representação contra autoridades que, no exercício de suas funções cometem abusos. No artigo 3º da referida Lei, alínea J, diz que constitui abuso de autoridade qualquer atentado aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. (Incluído pela Lei nº 6.657, de 5/6/79) com medidas e sanções asseguradas pela Lei.

A negação por parte do jornalista de não desligar o equipamento ou apagar os registros não configura crime de desacato. Além disso, o agente de segurança pública não pode mandar que o jornalista “apague o vídeo ou foto”, pois configura censura (vedada pelo § 2º do artigo 220, da Constituição), esta ordem pode resultar na destruição de provas.

Outra questão que o parecer chama a atenção é para a proibição por parte da polícia de “confiscar o celular sob o argumento de uma possível perícia e não permitir o acesso aos dados que consta nele e, possivelmente, não devolver é crime tipificado pelo art. 259 do Código Penal Militar”. O mesmo Código também determina no art. 222 que o recolhimento de celular ou câmara configura ainda crime contra a liberdade.

[26/6/17]

 

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